Atentado à imagem de Nossa Senhora Aparecida
Em 16 de maio de 1978, houve um atentado à imagem de Nossa Senhora Aparecida executado por um jovem Protestante iconoclasta que invadiu o nicho da imagem aproveitando-se de um blecaute, que termina na destruição da cabeça da imagem e na quebra do corpo em vários pedaços. Houve uma restauração da imagem feita no Masp concluída no mesmo ano, e seu retorno à Catedral Basílica de Nossa Senhora Aparecida. Posteriormente, tentativas de se retirar moldes causaram danos menores à imagem.
Atentado
[editar | editar código-fonte]Na tarde do dia do atentado, uma terça-feira, houve forte ventania em Aparecida. Durante a última Santa Missa do dia na atual Basílica velha, iniciada às 20h, já durante a distribuição da Sagrada Comunhão, às 20:10, ocorreu um blecaute de energia de aproximadamente 2 minutos de duração. Rogério Marcos de Oliveira, de 19 anos, aproveitou-se do blecaute, pulou subindo no nicho da imagem de Nossa Senhora Aparecida, quebrou o vidro protetor no terceiro golpe, pegou a imagem, gerando gritaria na igreja. Ao descer, a coroa ficou presa no vidro quebrado, depois caindo e sendo amassada. A cabeça da imagem desprendeu-se, caiu ao chão e estilhaçou-se em farelos. Eis que a luz retorna, e em meio ao tumulto, Rogério sai com o corpo da imagem, sendo alcançado na rua pelo guarda João Batista, que o puxa pelo braço. Não se sabe se pelo puxão ou desejo de destruí-la, deixa o corpo da imagem cair ao chão e empreende fuga nas ruas escuras de Aparecida. O jovem foi preso a pouco mais de um quilômetro da Basílica, perto do rio, sangrando com cortes na mão e no braço direitos. Foi levado à Santa Casa para tratamento, depois à delegacia e dois dias depois, a um sanatório, sem que se tenha registrado queixa contra ele.[1]
Depois descobriu-se que Oliveira era um jovem da cidade de São José dos Campos, iconoclasta, de um grupo Protestante[2] que havia sido exortado a destruir todas as imagens que pudesse. Tendo ido à paróquia de São José, bateu na imagem do santo com uma toalha. Tendo viajado para Aparecida, realizou o conhecido atentado.[3]
Após a fuga, alguns tentaram correr para linchar o agressor, ao que o Padre Antônio Lino Rodrigues CSsR, na tentativa de acalmar os fiéis, grita que a imagem roubada era falsa. As freiras Êgide e Efigênia começaram a juntar os cacos, depois sendo ajudadas por fiéis presentes, sendo que, infelizmente, houve fragmentos levados a residências. Os padres tentaram manter a versão de que a imagem quebrada era falsa, mas o bispo de Aparecida, Dom Geraldo Penido, revelou no dia seguinte que era a verdadeira, mas ainda escondendo o fato da grande fragmentação da imagem.[1]
Durante os próximos 33 anos, Rogério Marcos de Oliveira, que sempre carregaria o peso de ter sido “o louco que quebrou Aparecida”, conviveu com a esquizofrenia e com visões de anjos imaginários. Segundo o relato do jornalista Sérgio de Paula, passou o restante de sua vida em São José dos Campos graças à ajuda de parentes numa casa sem móveis, pois tinha medo de querer vendê-los para comprar drogas, usando um pedaço de carvão para desenhar demônios e santos nas paredes. Oliveira foi atropelado e morreu na via Dutra no fim de uma tarde de maio, em 2011, onde o motorista fugiu sem prestar socorro.[4]
Restauração
[editar | editar código-fonte]Dada a importância da imagem, cogitou-se no Santuário colocar uma réplica em seu lugar como sendo a autêntica, tendo logo sido abandonada a ideia. O assunto da restauração foi discutido em diversas esferas da Igreja. O reitor do Santuário, Padre Izidro de Oliveira Santos CSsR telefonou ao Vaticano tentando encomendar a restauração ao prof. Deoclecio Redig de Campos, que havia feito, seis anos antes, a restauração da Pietà, de Michelangelo. Este sugeriu que o Pe. Izidro recorresse ao diretor do Masp, prof. Pietro Maria Bardi. Este encarregaria o serviço à artista plástica Maria Helena Chartuni, à época chefe do Departamento de Restauração do Masp. Em 28 de junho, os padres Izidro e Antônio foram ao Masp, onde entregaram uma caixa branca contendo os fragmentos a Bardi e Chartuni. Perguntaram se estes eram católicos, ao que confirmaram. Rezaram todos uma Ave-Maria para abençoar os trabalhos, e o prof. Bardi acompanhou os religiosos à saída. À imprensa, Pe. Izidro dizia que tinham quebrado a imagem e que a levariam ao Vaticano para restauração, fato desmentido somente às vésperas da restauração ter ficado pronta, o que permitiu sossego nos trabalhos.[5]
No segundo dia dos trabalhos, a sala de restauração do Masp foi isolada com cordas, ficava vigiada 24 horas por dia por seguranças e teve o segredo da fechadura trocado, de forma que apenas Chartuni, Bardi, um fotógrafo do Masp e os padres tinham acesso à sala. Inicialmente a artista classificou cuidadosamente as peças, que eram mais de 200, sendo 165 do corpo. Estudou a cola a ser usada, selecionando uma cola argentina à base de epóxi. Começou pelas peças maiores do manto, depois as mãos, que estavam intactas, e assim por diante. A cabeça foi a parte mais crítica, pois o lado direito fora ou esfacelado, transformando-se em pó, ou perdido, desaparecendo em fragmentos, na noite da tragédia. A artista não teve alternativa a não ser esculpir o que faltava do lado direito da face baseando-se no que vira no lado esquerdo e em réplicas que os padres a levaram. O trabalho efetuado produziu uma cabeça quase idêntica à original, distinguível apenas aos que muito conheciam os detalhes da imagem da Padroeira.[6]
Durante a conclusão parcial dos trabalhos, a imagem estava ainda muito feia. Chartuni discutiu certa vez com Pe. Izidro sobre a cor da imagem. Este queria que esta fosse levemente clareada, sobre o que aquela discordou, querendo manter a cor da imagem à altura do atentado. O reitor exigiu exames de raio-X na imagem para certificar-se de que foram preservados os fragmentos e o pino de alumínio que foram introduzidos no passado. Pe. Izidro, extraoficialmente, não esteve contente com o andamento dos trabalhos de restauração, tendo pedido demissão de seu cargo assim que a imagem retornou a Aparecida.[7]
A restauração foi concluída em 31 de julho de 1978.[8]
Retorno a Aparecida
[editar | editar código-fonte]A imagem retornou a Aparecida sobre um carro do Corpo de Bombeiros. Relata a artista, que esteve no carro dos bombeiros, que “foi um corredor humano que foi da Avenida Paulista até Aparecida, de um lado e do outro”. “Os caminhoneiros vinham do Rio de Janeiro e, quando viam a imagem, se ajoelhavam em cima das cargas e rezavam”.[9][10][11]
A devolução da imagem a Aparecida ocorreu menos de duas semanas depois do falecimento do Papa Paulo VI, durante seu luto.
Danos posteriores
[editar | editar código-fonte]Menos de um ano depois, Padre Izidro, que esteve contrariado com como se procedeu a restauração, após ter renunciado mas antes de ter podido se retirar da reitoria do Santuário, subtraiu a imagem, deixando uma cópia no lugar, e a levou para se fazer um molde que a manchou consideravelmente. Então pintou-a com uma camada grossa de tinta automotiva e a devolveu. A restauradora foi novamente chamada às pressas. Retirou a tinta e a restaurou novamente. Dez anos mais tarde, novo evento de retirada de molde, que a encheu de manchas.[10]
Manutenção
[editar | editar código-fonte]Após proposta de Maria Helena Chartuni de dar assistência gratuita à imagem enquanto vivesse, o então bispo de Aparecida, Dom Geraldo Morais Pereira, assinou documento atribuindo-lhe esta responsabilidade.[10] A artista dá manutenção na imagem anualmente.
Repercussão
[editar | editar código-fonte]- Por diversos dias, os eventos relativos ao atentado foram capa dos jornais de todo Brasil. O diário do santuário traz que os jornais traziam comentários “bons, maldosos, falsos, inventados e apimentados, explorando o assunto ao máximo”. O evento saiu das manchetes apenas com o início da Copa do Mundo na Argentina.[3]
- O Prof. Plínio Corrêa de Oliveira, em artigo para o jornal Folha de S.Paulo, considerou a quebra da imagem como um sinal para o Brasil, que havia recentemente aprovado o Divórcio, como as aparições em Fátima, Portugal, foram um sinal para o mundo.[12]
Referências
- ↑ a b Alvarez, Rodrigo. Aparecida – A biografia da santa que perdeu a cabeça, ficou negra, foi roubada, cobiçada pelos políticos e conquistou o Brasil, GloboLivros, 2014, cap. 2.
- ↑ «Nossa Senhora Aparecida - 12 de outubro». www.traditioninactiondobrasil.org. Consultado em 26 de fevereiro de 2024
- ↑ a b ibid, cap. 3.
- ↑ ALVAREZ, Rodrigo (2017). Aparecida: A biografia da santa que perdeu a cabeça. Rio de Janeiro: Casa da Palavra/LeYa. pp. 46–47. ISBN 978-85-441-0660-0
- ↑ ibid, cap. 4.
- ↑ ibid, cap. 5.
- ↑ ibid, cap. 6.
- ↑ Restauração da Imagem de Nossa Senhora, programa Santuário em Ação, TV Aparecida. Enviado em 03/05/2011 ao canal da emissora no YouTube. Acessado em 12/10/2014
- ↑ Maria renova nossa fé, programa Deus com a gente, Paulinas TV. Publicado em 30/05/2014 no canal da PaulinasTV no Youtube. Acessado 12/10/2014.
- ↑ a b c Revista Veja, A fé está despedaçada – Entrevista com Maria Helena Chartuni, 28 de maio de 2011.
- ↑ «Há mais de 40 anos o Brasil presenciava a quebra do maior símbolo nacional da fé». www.a12.com. Consultado em 10 de outubro de 2023
- ↑ A Imagem que se partiu, Folha de S.Paulo, 29 de maio de 1978.
Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- História do atentado e restauração da imagem de Nossa Senhora Aparecida. Programa Central da Padroeira, TV Aparecida. Disponível no Youtube. Acessado 17/10/2014. Conta com diversos detalhes o atentado e sua restauração.