![]() São Paulo, segunda-feira, 16 de agosto de 2004 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Identidade cultural: língua e soberania ARNALDO NISKIER
Toda a riqueza do conceito de cultura vem da própria origem da palavra, do latim "cultivare", cultivar. Espíritos mais práticos perguntariam: por
que gastar o seu latim nestes tempos
descartáveis que vivemos? Uma resposta óbvia -pelo menos para aqueles que
lidam diretamente com a língua portuguesa e lutam pela sua preservação- é
que ela é conhecida como "a última flor
do Lácio", ou seja, foi a última ramificação do latim e, por obra e graça de uma
pequena nação de desbravadores, Portugal, espalhou-se pelo mundo, fincando raízes na América do Sul (Brasil), na
África (Angola, Moçambique) e na Ásia
(Goa, na Índia; Macau, na China; e Timor Leste, na Indonésia), tornando-se,
entre as 6.000 línguas do mundo, aquela
falada por 200 milhões de pessoas -o
rico universo da lusofonia.
Para avaliar a importância atual da língua portuguesa, bastam dois dados concretos: ela é hoje falada por 4% da população mundial, numa área de aproximadamente 8% do globo terrestre. Pensando no caso do Brasil, país de dimensões continentais que detém o maior contingente de pessoas falando o português, devemos estar atentos para o fato de que a língua entre nós é uma entidade viva, num processo de constante mutação. A explosão audiovisual promovida por novos meios de comunicação, como o cinema, o rádio e a televisão, e, mais recentemente, a revolução provocada pelos computadores e pela internet tendem a introduzir, a todo momento, palavras novas na língua e a "deletar" as antigas. A nossa opção de "bom português" não deve mais ser regida pela noção de "certo" e "errado", mas pelos conceitos de "adequado" e "inadequado" (como enfatizou a professora Cilene Cunha). Não podemos nunca defender a existência de um apartheid lingüístico, separando o falar do rico e o do pobre. Temos uma realidade plurilingüística, levando em conta basicamente que a norma culta deve ser obedecida sobretudo nos códigos escritos. A compreensão desse fato enseja uma profunda mudança no ensino do português, sabendo-se que é o povo que faz a língua. Pode-se concluir daí que a leitura liberta e nos leva a conhecer melhor o mundo, o outro e a nós mesmos. A linguagem manifesta a liberdade criadora do homem. Arnaldo Niskier, 68, educador, membro da Academia Brasileira de Letras, é conselheiro do Imae (Instituto Metropolitano de Altos Estudos) e secretário estadual de Cultura do Rio de Janeiro. Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Eduardo Portella: Educação na fila de espera Próximo Texto: Painel do Leitor Índice |
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