Rangel Alves da Costa*
Não há como negar. Verdade é que o ano de 2012 vai deixar saudade. Não a saudade do que ele causou, mas a saudade de quem nele partiu.
Saudade dos nossos que partiram tão cedo, ainda que já envelhecidos. E uma saudade assim se eterniza e se renova a cada novo ano. Ao menos para os que compreendem o significado das perdas e despedidas.
Forçadamente dei adeus a familiares, a amigos, e chorei por todos no silêncio angustiante do sofrimento. Em novembro meu pai deu adeus ao sertão. Raiz que sou, ainda não brotei a flor do renascimento. Morri um pouco também, e continuo assim com olhos de sequidão.
Mas é na fronteira do ficar e partir que o ser humano deve decidir sua sorte, seu destino. E porque continua com a dádiva divina da existência, o que se tem a fazer é seguir em frente com as lições aprendidas, as dores sofridas...
Deve haver, sim, lugar para a gratidão. Se conseguiu percorrer todo o ano, permaneceu saudável e esperançoso, não há como não ser grato pela existência. Basta olhar para trás e ao redor e sentir que muitos não possuem a mesma sorte.
Ora, só mesmo a força divina para não ser vitimizado pelas aberrações e incongruências do mundo. Num tempo de tecnologias inimagináveis, de avanços científicos surpreendentes, ainda ninguém conseguiu a fórmula para a diminuição da desumanidade.
Ao lado das catástrofes naturais, das inúmeras vidas perdidas nos terremotos, nas enchentes e outros sinistros, coube ao homem acrescentar sua porção de maldade, como sempre faz. Invadiu escolas e matou inocentes, tirou a vida de quem tanto queria viver.
E enquanto burocratizam a vida, assinam protocolos de intenções, prometem mudar os destinos do mundo, eis que crianças continuam vergonhosamente apodrecendo nos descampados africanos, a miséria absoluta se alastrando no interior nordestino, inocentes morrendo nas guerras egoístas.
2012 também foi o ano da hipocrisia, da mentira, da bajulação desavergonhada. Não há nada mais desrespeitoso à inteligência do cidadão do que querer negar o óbvio e pretender transformar o absurdo num cesto de flores. E mais absurdo ainda querer desqualificar a verdade para encobrir podridões. Mas assim aconteceu.
Tornou-se verdadeiramente insuportável ouvir sobre a eterna inocência de Lula, com aquela mesma velha ladainha de que nunca fez nada, nunca soube de nada. Por mais que o crivo da verdade esteja espelhado em tudo, ainda assim lançam perfume em dejeto. E ainda pedem a beatificação. Certamente já está canonizado para muitos. Lamentável que seja assim.
E que ano mais entristecido. Numa só pessoa foi embora Véio Zuza, Haroldo, Painho, Jovem, Alberto Roberto, Azambuja, Bozó, Canavieira, Coalhada, Divino, Gastão, Justo Veríssimo, Nazareno, Popó, Pantaleão. E Chico Anysio.
Saudade muita deixada por Niemeyer, Hebe, Sérgio Britto, Regina Dourado, Tinoco, Millôr Fernndes, Joelmir, Dona Canô, Além de dezenas, milhares de pessoas simples que morreram a espera de atendimento nos deploráveis serviços de atendimento à saúde.
Em muitas situações, 2012 foi um ano para demonstrar quanto ainda vivemos na imbecilidade, no desrespeito, na afronta aos princípios morais. Xuxa recebeu milhões para tingir e enegrecer o cabelo, Ronaldo recebeu outros milhões para perder peso, artistas famosos receberam outros tantos milhões do governo para produzir shows.
E quando foi destinado aos sedentos e famintos do Nordeste, aos desalojados pelas chuvas, aos que ainda vivem em condições subumanas nesse país cujo programa social mais importante chama-se exatamente Brasil Sem Miséria?
2012 foi o ano marcado para acabar, o que acabou sendo adiado. E adiado para data mais próxima do que muitos possam acreditar. O homem que incessantemente destrói, devasta, degrada, violenta de todas as formas a natureza e o seu próprio ambiente de vida não pode esperar viver muito.
Quanto a mim, sofrido, calejado, mas vou seguindo em frente. Enquanto o vento soprar na minha janela estarei seguindo adiante. E quanto mais rápido ele sopra mais rápido vou seguindo. Sou apenas uma folha esperando um outono qualquer.
Poeta e cronista
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