SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



sábado, 23 de abril de 2022

TRISTE BRASIL


*Rangel Alves da Costa

 

Em obra-prima da antropologia e intitulada “Tristes Trópicos”, o pesquisador belga Claude Levi-Strauss traça um panorama essencialmente pessimista do Brasil. A partir de suas pesquisas etnográficas desenvolvidas na década de 30, o professor Strauss chegou chegaria à conclusão que mesmo sendo um país de triunfante beleza e de natureza exuberante, o Brasil pecava de males que o colocaria como um belo tapete encobrindo lastimosas situações.

A degradação ambiental, o crescimento desordenado das cidades, o esfacelamento das relações sociais, as discrepâncias no acesso aos bens de sobrevivência, a situação deplorável da causa indígena. Com efeito, focando principalmente as sociedades indígenas por ele visitadas em expedições, Strauss chama atenção – já naquele período – para o desprezo que as culturas e as tradições indígenas estavam relegadas. Povos originários já sendo alcançados pela devastadora modernidade.

Passaram-se os anos, mas as reflexões continuam com plena validade. Contudo, a atual tristeza dos trópicos possui uma amplitude ainda maior. Um entristecimento que abarca a visão sobre os poderes da República, sobre governantes e políticos, sobre julgadores, sobre a mídia, sobre os costumes, sobre o pensamento da população. Nada, absolutamente nada no Brasil, parece ser respeitado. A inversão de valores passou a ser de tal monta que hoje se tem como normalidade o absurdo, o espantoso, o jamais imaginado para um dito Estado Democrático de Direito.

Será que estes trópicos se alegram com babaquices como Big Brother Brasil e outros formatos de enojar? E devem chorar ao saber das inúmeras pessoas apaixonadas por tais manipulações da realidade. Daí que nas pessoas também a corda sendo puxada para o imprestável, para o abismo. Não há que se esperar grandes coisas de pessoas que ao invés de procurar engradecer pelo conhecimento, eis que acabam preferindo o lamaçal dos degradantes modismos.

Hoje, por exemplo, todos os sites noticiosos estampavam textos e fotografias sobre o namoro da atriz Fernanda Souza com uma mulher, e repetindo-se com fatos novos sobre o mesmo nada. Será que não existiria nada mais sério e interessante nestes trópicos apunhalados pela babaquice? Ou será que a realidade brasileira se resume à traição da mulher com o morador de rua, ou ainda a exposição e os detalhamentos dos trisais existentes por aí? Mas é o que a mídia parece se preocupar. E tudo como se toda a população tivesse que engolir a qualquer custo.

Não há mais fome nestes tristes trópicos? As pobrezas, as carências e as mendicâncias já se generalizaram de tal forma que não merecem mais qualquer destaque na grande imprensa? Será que não vale mais a pena o conhecimento dos sofrimentos e das dores ainda tão presentes nos sertões? Com efeito, muita coisa não há mais que ficar batendo na tecla, principalmente pelo fato de que já fora constada a morte de muita coisa: a seriedade no povo, o seu poder de indignação, a incessante luta para mudar o caos em esperança.

Realmente, triste é constatar que o Brasil já desfaleceu em muitos aspectos. Um governo democraticamente eleito, mas que elege a tirania para se manter no poder, já diz bem ao ponto de fragilidade que estes tristes trópicos passou a ter, e medonhamente conviver no seu dia a dia de abusos e opressões. Um governante que prefere ferir a todos em nome do mando, que prefere rasgar as leis a respeitar as decisões, que prefere negar a aceitar as verdades, não poderia vingar noutro país senão nestes tristes trópicos.

Não pode ser tida como uma nação civilizada aquela onde parte de sua população tem preferência por manter no poder um ditador, um sanguinário, uma pessoa demoníaca e extremamente perigosa. Que povo é este que perdeu a consciência de realidade, que parece acometido de cegueira das boas virtudes, que aplaude e fanatiza aquele que mais adiante irá lhe apunhalar? Strauss ficaria envergonhado com tal realidade existente nestes tristes trópicos.

O país onde o dinheiro compra tudo, principalmente a honra e o caráter de políticos eleitos pelo povo, e somente para depois se tornarem algozes desse mesmo povo. E todos têm que aceitar calados, sem insurgência ou luta alguma, pois também sabem com quem estão lidando. E lidam com uma população que se preocupa mais com o Big Brother Brasil do mesmo com o seu futuro, que acha mais importante saber que roupa usou a famosa ou da namorada mulher de outra mulher.  

Tristes trópicos. Triste Brasil!

 

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com


Lá no meu Sertão...


Avistando a vida, o mundo, tudo...



O outro lado do rio (Poesia)


O outro lado do rio

 
Aqui é feio
é triste e angustiante
mas há um rio
e no outro lado rio
eu avisto a paz
eu vejo a esperança
e um porto seguro
 
mas não sei nadar
 
entristeço e choro
preciso partir
sair logo daqui
onde a solidão oprime
os dias são noites
as rosas são espinhos
e o medo a rondar
 
vou aprender a voar...
 

Rangel Alves da Costa


Palavra Solta – famosinhos de nada, “influencers” e “idioters”


*Rangel Alves da Costa

 

A mídia gosta de endeusar o imprestável. Também gosta de dar denominações aos modismos e até ao inexplicável. É por culpa da mídia, por exemplo, que as pessoas deixaram de ser masculinas ou femininas (respeitando-se as opções sexuais) para se transformarem em “pansexuais”, “intersexuais”, “binárias”, “não-binárias”, e por aí vai, e que igualmente refletem orientações sexuais. São tantos termos surgidos que de repente fica difícil saber quais os limites de uma coisa perante outra. Mas é no endeusamento de certas pessoas, até então no reles do comum social, que mais a mídia procura embabacar toda a sociedade. Isso mesmo, pois a mídia imagina um mundo como uma aldeia de babacas e, daí em diante, vai jogando em cada um o que não presta, o que tem de ser engolido forçadamente. Vai transformando babacas desconhecidos em famosos, vai transmudando imbecis em ilustres personalidades. Basta alguém utilizar as redes sociais e atrair seguidores, para de repente já ser tida como verdadeira celebridade. Assim acontece com os ditos “influencers” ou “blogueiros”. Na verdade, quem valoriza ou cegamente segue o influencer não tem capacidade de pensamento, de decisão, não tem conhecimento válido de nada. Ou, com acerto já disseram que o que cria um influencer é a quantidade de idioters. A quantidade de idiotas (e que são milhares) que acompanha essas porcarias. E também a mídia, que celebriza e endeusa o imprestável.

 

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com


quinta-feira, 21 de abril de 2022

CANGAÇO E CONHECIMENTO (PRA NÃO ACREDITAR NA MENTIRA NEM SER MAIS UM MENTIROSO)


*Rangel Alves da Costa

 

Todo santo dia surge mais uma baboseira sobre o cangaço. Só faltam dizer que encontraram Lampião na porta do INSS para fazer prova de vida. E não sei se não dizem. Um diz que Lampião morreu em Minas, já outro assevera que sua morte ocorreu na alagoana Pão de Açúcar.

Um diz que morreu envenenado, já outro diz que nem morreu. Pelo jeito, Angico vai se tornando última opção como local de morte. Sim: dizem que aquelas cabeças eram de manequins, pois tudo armação para esconder a fuga acertada de Lampião. O sangue era tinta vermelha e os corpos degolados eram de mentirinha.

Todo santo dia surge uma história assim, sem pé nem cabeça, coisa que nem faz boi dormir. O pior é que muitos acreditam. E pior ainda que muitos escrevem sobre tais mentiras como se verdades fossem. E vão espalhando as aleivosias e os embustes de forma vergonhosa, mas sem vergonha alguma.

Por que tudo isso ocorre? Ora, só pode ser por falta de conhecimento histórico, principalmente da história do Cangaço. E conhecimento que implica em leitura, em pesquisa, em estudo de campo, em ter tempo para ouvir os antigos relatos e testemunhos, para ter capacidade suficiente de avaliar criticamente o dito e o escrito, extraindo de tudo as possíveis verdades. Ou as muitas mentiras.

Conhecimento que implica ainda em buscar diversos escritos sobre a mesma situação, de modo a tornar os múltiplos relatos em possível norte de entendimento. Para conhecer o Cangaço não se deve buscar as aparências ou basear-se somente em teorias conspiratórias. O Cangaço é uma colcha de retalhos que deve ser avistada no todo, desde suas raízes à junção de cada pedaço, pois um entremeado de ações e consequências. E num contexto que envolve injustiça, opressão, vingança, coronelismo, política e traição, dentre outros aspectos.

O acontecido permanece na história, os testemunhos ainda são muitos, mas gente ainda há que prefere o achismo ou o duvidoso. Tudo bem, mas será preciso um mínimo de atenção aos fatos, aos contextos e suas relações. Não se pode dizer apenas que não foi assim. Mas por que não foi assim? Então há que se demonstrar, com seriedade e provas, como de modo diferente aconteceu.

A maioria dos livros sobre o cangaço peca pelas ideologias e defesas próprias dos autores, sem buscar a devida isenção que todo escrito histórico precisa ter, mas ainda assim muitos escritos existem que são confiáveis e que – senão donos da verdade – ao menos traçam confiáveis percursos.

Os testemunhos gravados e que vão surgindo, igualmente devem ser vistos com ponderação, senso crítico e agudeza de discernimento. Até mesmo aqueles que estavam em Angico contam a mesma história de forma diferente e, na maioria das vezes, trazendo para si um protagonismo que nunca existiu. Volantes, coiteiros, cangaceiros, tudo contando a seu modo o que aconteceu de uma forma única. E assim fica difícil de saber quem está dizendo a verdade.

E eis a chave do problema. Apenas um livro ou dois não vai dar o conhecimento suficiente a ninguém. Apenas um testemunho ou dois não vai trazer a verdade a ninguém. Por isso mesmo será sempre preciso o descontentamento. Não se contentar com a história dada é a raiz da questão.

E assim, mesmo que jamais chegue a verdades absolutas sobre a história do Cangaço, a pessoa ao menos não vai querer nem ler ou ouvir baboseiras, mentiras, coisas de quem parece não ter o que fazer.

 

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com


Lá no meu Sertão...


Lindo Sertão






Amor sem gramática (Poesia)


Amor sem gramática

Te amo
em errado português
pois amo-te é muito frio
para o amor
escrito de seu jeito
amado de seu jeito
vivido e sentido
assim desse jeito
 
te amo
e rasguem a gramática
para deixar em nudez
o amor.

 
Rangel Alves da Costa